Já faz mais de um ano. Estava na Saraiva, olhando as novidades, quando
descobri uma obra que me chamou a atenção: a biografia de Piotr Tchaikovsky.
Peguei o livro – 882 páginas – e sentei-me para ver as fotos e ler o prefácio.
Fiquei sabendo que o autor, o historiador russo, Alexander Poznansky , tomou
como missão pesquisar profundamente a vida do compositor, o que não havia sido
feito até então. Entusiasmei-me. Sempre gostei de biografias. Havia ainda uma de Dostoievski, que pensei em
comprar logo que acabasse de ler a de Tchaikovsky.
Já nas primeiras páginas comecei a me embaralhar com os nomes. Ilhya Petrovictch era seu pai, e sua mãe Alexandra
Andreevna. Tchaikovsky , como esperava a
família, foi estudar Direito na mais conceituada escola, fundada pelo Príncipe
Gueorguievitch Oldenburgsky (????? Será que copei certo????) A disciplina era
rígida, mas o Principe levava, nos
fins-de-semana, os alunos para se divertirem em seu palácio. E este lazer
continuou com o novo diretor, cujo nome não vou escrever porque é tão enrolado
quanto o primeiro. UFA!!!! Mas o que fazer se sua vocação é outra? Conforme diz
seu irmão Modest, são as óperas, os ballets , enfim todo o mundo musical que o
fascinam! Por outro lado, sua vocação sexual desabrocha lenta, mas claramente.
Uma vez concluído o curso de Direito, vai trabalhar no Departamento de
Justiça, onde ocupa alto posto. Mas o conflito interno é intenso, entre a
música e a burocracia, a independência e o rigor do cargo. Por fim, entra para
o Conservatório de Música, onde seu pai é aconselhado, por certo fulano, a
fazê-lo desistir, já que não vê nele pendores musicais! Mas Tchaikovsky
insiste, da mesma forma que dá fim ao seu conflito de homossexualidade. Na
Rússia Czarista, ao contrário do
Ocidente, onde homossexuais eram queimados, esta opção era considerada um
pecado com qualquer outro. Ivan IV e Pedro o Grande praticavam esta forma de
relação. Aliás, também foram homossexuais Alexandre, o Grande, da Macedônia,
Ricardo Coração de Leão, Leonardo da Vinci, Michelangelo, o grande geógrafo, naturalista,
antropólogo, Alexander Von Humboldt, e outros de que não me lembro. E que não
vêm ao caso. Até aí tudo bem, estou no
início do livro, há ainda poucos personagens, apesar de já existir certa
confusão na minha cabeça. À medida que a biografia avança... Já li alguns
romances russos, mas aqui a pesquisa é profunda e os atores brotam das páginas
como mato da terra molhada!
Então, tenho a idéia de anotar os nomes num caderno de capa dura. O trabalho
é grande porque, como o livro é volumoso, tenho que lê-lo sentada na cama, com
almofadas nas costas e sobre as pernas, cada vez que anoto um nome,
soletrando-o, tenho que tirar o livro – 882 páginas - da almofada e colocar o
caderno, indicando de quem se trata. Por vezes, me embaralho com os nomes e
penso que fulano é beltrano, já que há pouca diferença, uma ou duas letras,
entre um e outro. Aos poucos descubro que há grande número de garotos de
programa na principal Avenida de São Petersburgo, cujo nome não interessa. Foi
nesta ocasião que Modest, irmão do compositor, declara seu homossexualismo. É uma época de intensa dissipação na vida do
compositor. E escreve a Modest acerca do enorme prazer que desfruta junto a certo
garoto de programa. Não esconde mais seu homossexualismo, e em 1869 vai a um
baile de máscaras vestido, de mulher. Anoto no caderno “Vladimir Shilovsky,
provável incentivador da idéia, gostando os dois de gozação”. E os nomes
continuam: Botchetchkarov, alcoviteiro homossexual, Nikolay Lvovitch, outro
alcoviteiro que o levou a um “rendez-vous” com um rapaz encantador. Mas será
que eles voltarão a figurar na biografia, terão alguma importância, além de
alcoviteiros? SOCORRO!!! Por que não conheço alguém que saiba russo e possa me
acompanhar nas minhas leituras, relembrando os nomes? Só conheço, de ver na
televisão, Wladmir Putin, Dmitri Medvedv, e o Ministro das Relações
Exteriores!!! Cada tarde que passo lendo minhas costas doem. Por que não se
chamam como todo mundo: João, Pedro, Correia, Lula, Silva, Viana, Maria, Dilma?
E os alcoviteiros, Renan, Romero? Isto é o normal...
Durante estes anos, ele se mantém como professor no Conservatório, mas
suas viagens são freqüentes, seja a São Petersburgo, Paris, e às mais lindas
cidades italianas. No entanto, ainda espera o pai – a mãe morreu cedo – que seu
filho cumpra o dever de todo homem, ou seja, que se case e forme uma família. Vladmir
Shilovsky , aquele que induziu Tchaikovsky a vestir-se de mulher, e que tinha “problema”
análogo ao seu, resolve casar-se. A respeito deste casamento, com uma condessa rica
- Alexeevna Vassilieva – (anotei o nome e sua função, já que não sabia de sua
importância) comenta em carta ao irmão Modest: “(Shilovsky ) ...rompeu a
virgindade da mulher......Ontem almocei com ele. A mulher é uma feiosa terrível
e parece estúpida, mas é muito “comme il
faut.” O casamento do amigo – que parece durou três anos – dá-lhe impulso para uma solução análoga para seu
“problema”. Alguns membros da família sabem de sua homossexualidade, mas não
seu pai. Além disso conhece, através de
sua música, uma protetora rica – Nadejda Filaretovna Von Merck, viúva de um
riquíssimo industrial alemão, obcecada pela beleza de sua música. Durante anos,
ela praticamente o sustenta, pois o
compositor gasta muito mais do que recebe como professor do Conservatório e vive
sem dinheiro. No entanto, em uma carta, ela deixa explícito o que considera
apropriado ao caráter de um homem superior. Tchaikovsky prevê algum problema,
caso ela desconfie de seu homossexualismo. Evita, portanto, de conhecê-la
pessoalmente, o que não traz para a protetora nenhuma desconfiança.
Nikolay Kondratiev, fazendeiro rico, apesar de casado e pai de uma filha,
mantém relações íntimas com seus empregados jovens. Fatos como este eram comuns
naquela sociedade, sobretudo na rural, onde normas de conduta eram
especialmente “liberais”, entre senhores e “mujiques”, servos da terra. O próprio Tchaikovsky, apesar de amar
fraternamente seu lacaio, Aliosha, para ele empregado , companheiro,
fraternalmente amado, em um período sombrio de sua vida, escreve a seu irmão
Modest:” Ele entendeu perfeitamente bem o
que eu precisava dele no momento e satisfaz com abundância todas as minhas
exigências.” É preciso lembrar que Tchaikovsky nasceu, viveu e morreu sob o
regime czarista, em que diferenças sociais eram consideradas ontológicas.
O modelo expresso por Kondratiev talvez
seja mais um impulso para o compositor “cometer” o casamento. A noiva chama-se
Antonina Miliukova. Casam-se, mas o marido jamais consegue consumar o
casamento. Antonina tenta todos os meios e só consegue como resultado seu ódio
mortal. Esta foi uma época de conflitos intensos que quase levam o compositor à
loucura ou à morte. Afinal, Antonina parece se convencer da realidade quanto ao
homem que ama sinceramente, e volta à sua casa. Virgem!
Para terminar este texto, que já se torna muito longo , e que contei até
onde consegui ler, quero transcrever uma anotação de Tchaikovsky no seu diário:
“ Quando conheci Léon Tolstoi, fui tomado
de medo e embaraço. Parecia-me que aquele grande entendedor do coração humano ,
com um olhar, penetraria em todos os esconderijos da minha alma...”
Bem, acho que até meados do próximo ano posso concluir a leitura. E
confesso que em certos momentos fiquei tão confusa que passei por cima de
pessoas e nomes. A biografia é muito detalhada e minha cabeça não deu conta!
E desisti, definitivamente, de ler a biografia
de Dostoievskchaikovsky e eu
3 comentários:
Seu comentário é tão gostoso, que me deu vontade de ler o livro! 😉
Haja fôlego para tantos nomes e minúcias. Mais facil ouvir a música do gênio!
Obrigada, amigos. Logo retomarei minha tarefa, que afinal, apesar de tudo,me dá muito prazer!!!!
Abraços, com muito afeto!
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