Quando acendi a
televisão devia ser meio-dia. Imediatamente vi a cara de Collor falando com a
pessoa que estava a seu lado. Era o Ministro da Justiça, e notei que não lhe
dava muita atenção. Imediatamente, a jornalista faz alguma alusão à chegada dos
restos mortais de Jango à Brasília para autópsia que deverá constatar se foi
assassinado ou não. O ambiente era de luto. Antes que chegasse a viúva, Maria Teresa,
e alguns membros da família, mostrou-se a platéia. Senti um arrepio, como já
havia sentido quando vi Collor. Ali estava Dilma, a Presidente, acompanhada dos
ex- Presidentes ainda vivos. Faltava Fernando Henrique, que se trata de uma
diverticulite. Faltava Itamar. Fiquei imaginando as voltas que o destino dá.
Afinal, por uma questão protocolar estavam
ali dois homens que em nada honravam o Presidente deposto por um golpe militar,
que nos jogou durante vinte e um anos nas trevas de uma ditadura. Sarney e
Collor, que, sinceramente, não sei por que figura sempre entre os
ex-Presidentes. Afinal o homem foi enxotado da Presidência por corrupção. Mas
faz parte da base aliada, como noventa e cinco por cento do Congresso. E havia
ainda Renan, Lobão, e certamente muitos outros que sempre defenderam a ditadura
e que agora são Ministros ou ocupam outros postos de destaque. Fiquei enojada.
Na primeira fila, Dilma, sem dúvida era a pessoa mais digna. E Lula, apesar do
meu anti-petismo deveria sentir alguma emoção ao ver chegar os restos mortais
do homem cujo grande crime foi querer mudar um pouco este país de coronéis, que
lutou pelas reformas de base, e ingenuamente se deixou arrastar numa cilada
armada pelos inimigos.
O tempo que vivemos nos faz testemunhas de velhas histórias que os mais jovens não podem contar. Lembro-me de que há alguns anos, estava jantando com alguns amigos de Ricardo, meu ex-companheiro, e uma jovem disse: “ Não guardo nenhum sentimento em relação ao “período militar” (é a forma como a direita, que me cercava, chama, eufemisticamente, a ditadura). Imediatamente retruquei: “Mas a minha geração guarda grande ressentimento contra a ditadura!”E guardamos porque vivemos nossa juventude sob o seu tacão, porque vivenciamos mortes e desaparecimentos, porque a única e maravilhosa coisa que nos restava era a esperança! Creio que os longos períodos de governos autoritários , como a República Velha, ou ditatoriais como o Estado Novo e a ditadura militar , aliados à absoluta falta de formação, não permitiram que o brasileiro aprendesse a votar. Depois de Juscelino, Presidente democrático, progressista, colocaram no governo um maluco, cujo objetivo era instalar no país uma ditadura.Renunciou por razões ainda obscuras. Era o momento do golpe, não concretizado graças a Brizola e às forças progressistas. Aí começaram as estratégias para enfraquecer o vice que tomara posse, Jango. Até que uma cilada fatal, que colocava em cheque a hierarquia militar derrubou-o. Hoje conhecemos melhor o período e sabemos o papel que desempenhou cabo Anselmo, que, por incrível que pareça, andou querendo receber dinheiro por perseguição política!!!! Mesmo generais amigos de Jango o abandonaram, como Amaury Kruel, que o considerava como um filho. Foi a partir daí que mergulhamos nas trevas.Lembro-me de Jango, ao lado de Maria Teresa, linda, no célebre discurso de 13 de março na Central do Brasil. A sua figura me passava uma tragicidade, que guardo na mente e no coração até hoje. No dia primeiro de abril, ou seja vinte e quatro dias depois, deu-se o golpe. O posto de Presidente foi considerado vago, anunciado por um tal de Ranieri Mazzini, que creio era Presidente do Congresso. Lembro-me de Jango embarcando para o exílio. Para sempre.
Jango
queria fazer o que é absolutamente necessário ao país. Revoltou-me ver aquelas
figuras asquerosas na sua última e devida homenagem. E uma última lembrança,
esta não tão antiga: a última vez que meu pai, general, saiu à rua, por
absoluta necessidade burocrática, comigo e com Teresa, cerca de uma semana
antes de sua morte, passamos por um sujeito que disse a seguinte frase: “ Se os
militares não tivessem impedido,nós estaríamos no comunismo.” Ao ouvi-lo, meu
pai retrucou, com voz forte: “Quanta burrice!” E viva o velho Felippe, que não
abandonou, até seus últimos dias, os ideais socialistas de justiça social e
nunca se curvou! Sinto imenso orgulho dele!
2 comentários:
Querida que belo texto! Assino embaixo.Nem sempre na vida existe a justiça e a ordem.Mas na memória ficam os grandes homens e seus feitos.Cabe a nós lembrar e passar para frente a história real.Bjs Eloah
Que bom que voltamos aos nossos velhos tempos !!!!! Senti um enorme prazer quando vi seu comentário! Aliás como sempre inteligente e adorável. Bjs.
Tenho avisado pelo Facebook quando escrevo um texto:
mariaviana
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