Conheci
Bibi dentro de um caixãozinho branco, recoberto de véu também branco. Ao lado
do seu rosto, como se dormisse com ela, sua bonequinha de pano que a
acompanhava desde sempre. Nas mãos cruzadas onde se via um terço branco, se
destacavam as unhas pintadas de rosa-pink. Tive vontade de beijar seu rosto,
mas senti uma censura dentro mim. Ao invés disso, beijei suas mãozinhas geladas
pela morte. Meu réquiem sem música era, no entanto, verdadeiro. Havia uma
criança morta, aos oito anos, feitos alguns dias antes. Não contive as
lágrimas, como a maioria das pessoas que ali estavam. Abracei e beijei a mãe,
que mostrava no rosto o sofrimento de mais de dois anos de luta contra um câncer
que, afinal, levara sua Bibi. Seu rosto, apesar do sofrimento, sorria, e
mostrava simultaneamente a dor e a serenidade de quem lutou até o fim. O pai
tinha a mesma expressão de dor, mas mostrava calma. Ambos haviam, naqueles
quase três anos, dedicado suas vidas à filha, que sabiam irremediavelmente
condenada.
Por
que aos oito anos, depois de tanto sofrimento, Beatriz partira? Inexplicável.
Como diz o Eclesiastes:
“Há um momento para tudo e para todo
propósito debaixo do céu.
Tempo de nascer,
E tempo de morrer;
tempo de plantar,
e tempo de arrancar a planta.
................................................
Tempo de chorar,
e tempo de rir;
tempo de gemer ,
e tempo de bailar.
.................................. “
Bibi
deve ter cumprido seu tempo. A plantinha tenra foi arrancada. Mas foi tão breve
seu tempo! Foi arrancada dos braços amorosos de seus pais, avós, mas foi
recebida nos braços de Deus, criaturinha sem pecados.
Foi aos meus oito ou nove anos, que vi, pela primeira vez, uma criança morta. Era
um menino e deveria ter cinco ou seis anos. Foi numa casa pobre num bairro
popular, uma daquelas construções de duas janelas que dão diretamente sobre a
rua. Havia morrido de alguma doença na cabeça, quem sabe hidrocefalia. Tinha a
cabeça enorme, descomunal para seu corpo que parecia ser miúdo. Uma cor
amarelada, doentia, que mesmo a mim, criança, impressionou. Ficamos debruçadas
na janela olhando, minha amiguinha e eu. Alguém depois nos disse do que
morrera, mas não guardei na memória, é claro. No entanto, aquela imagem da
criança morta, nunca mais esqueci. Muitos anos depois, vi o neto de uma amiga
dentro de um pequeno caixão, depois de uma longa luta contra a leucemia. Tinha dez
anos.
E
ainda diz o Eclesiastes:
“....Também colocou no coração do homem o
conjunto do tempo, sem que o homem possa atinar com a obra que Deus realiza
desde o princípio até o fim....”
Temos
todos o nosso tempo, de chorar de rir, de
gemer e de calar. E de morrer.
Mas não podemos atinar com a obra de Deus.
Um comentário:
Querida que texto lindamente escrito, mesmo que a tristeza faça parte da descrição e da morte de crianças inocentes.
Nem sempre entendemos os propósitos, mas como diz o Eclesiastes “Há um momento para tudo e para todo propósito debaixo do céu..."
Brisas e felicidades para você.
Bjs. Eloah
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