QUEM SOU EU

Sou professora de Francês, mas hoje minha principal atividade é escrever e ler, além de cuidar dos meus três vira-latas: Charmoso, Príncipe e Luther.



Gosto de fazer ginástica, sou vegetariana e adoro animais em geral, menos baratas.



Sinto especial prazer quando meus textos agradam aos meus leitores. Espero continuar produzindo e me comunicando com todos os meus amigos, neste maravilhoso universo da net.



Seguidores

terça-feira, 22 de junho de 2010

BELEZA É FUNDAMENTAL


Coloquei no novo blog “Beleza é fundamental”, uma foto que mostra uma das mais belas mulheres deste mundo, em geral habitado por gente feia. Linda, sensual, e com aquele ar ingênuo, de menina meio perdida no mundo mau. A foto foi tirada, creio eu, em 1947, quando ela tinha apenas vinte e um anos. Era uma moça pobre, filha de mãe esquizofrênica, abandonada pelo pai e criada num orfanato. Ao sair, dizem, foi adotada por uma família pobre, que, tendo se mudado de cidade, não pode levar consigo a mocinha. Em 1942, Norma Jean, seu nome verdadeiro, resolveu casar-se com seu namorado de algum tempo, por quem, parece, estava apaixonada e que a livraria do orfanato. Tendo o marido sido convocado em 1944, Norma Jean passou a trabalhar numa fabrica onde foi vista por um fotógrafo que percebeu o potencial incrível daquela mocinha e contratou-a para posar. Daí pra frente, com os cabelos louros, e já rebatizada Marilyn Monroe, teve que escolher entre a carreira e o casamento. Divorciou-se em 1946. Parece que foi no ano seguinte que posou para a foto que coloquei para ilustrar o blog e que, passados mais de sessenta anos, ainda é considerada uma das mais belas, senão a mais bela foto de nu feminino.

Marilyn, a menina pobre, bastarda, filha de mãe esquizofrênica, criada num orfanato, tornou-se a mulher mais famosa do século XX. Marilyn, que, quase cinqüenta anos após sua morte, ainda encanta, e faz sonhar. E provoca inveja em outras mulheres que sonham em ser tão lindas quanto ela. Marilyn, que morreu solitária , talvez tentando salvar-se, com a mão estendida em direção ao telefone.

Conto tudo isto, já que, parece, a beleza desta nudez singela, singela como a nudez exposta pelos mestres Renascentista, pareceu pornográfica (!) a gente que vive no século XXI (!), que já deve ter visto, ainda que seja de passagem, algum quadro dos grandes gênios. O que dizer, então, do David de Michelangelo, exibindo sua virilidade no seu órgão másculo exposto? E a arte grega? E a romana? Ora, para mim pouco importa o que digam alguns ou algumas invejosas e ignorantes. Marilyn, naquela foto, é a Venus de Boticelli, que emerge nua das águas, e que nunca, ninguém poderá apagar. Marilyn, deusa da beleza, que durante pouco anos, infelizmente, encantou o mundo, é a Venus do século XX, sem silicone, sem lipo, sem ginástica, sem photoshop. Esta mulher jamais poderá ser considerada pornográfica, e sua foto esplendorosa, mostrando toda sua nudez, para sempre ilustrará o que se quiser falar de beleza.

Para ela, escreveu este lindo poema, Ernesto Cardenal, poeta, religioso e revolucionário nicaragense

Oração para Marilyn Monroe


Senhor

recebe esta moça conhecida em toda a terra pelo nome de Marilyn Monroe
ainda que este não seja o seu nome verdadeiro
(mas Tu conheces o seu nome verdadeiro, o da pequena orfã).
violentada aos 9 anos,
a empregadinha de loja que quis se matar aos 16
e agora se apresenta diante de Ti sem nenhuma maquilagem
Sem seu Agente de Imprensa
Sem fotógrafos e sem assinar autógrafos
sozinha como um astronauta diante da noite espacial.
Ela sonhou quando menina que estava nua em uma igreja
(de acordo com a Time)
diante de uma multidão prostrada, com as cabeças no chão
e tinha que caminhar na ponta dos pés para não pisar nas cabeças.
Tu conheces nossos sonhos melhor que os psiquiatras.
Igreja, casa, cova, são a segurança do seio materno
mas também é mais que isso.

As cabeças são os admiradores, é claro
(a massa de cabeças na escuridão debaixo de um jorro de luz).
Porém o templo não são os estúdios da 20th Century Fox
que fizeram de Tua casa de oração um covil de ladrões.

Senhor
neste mundo contaminado de pecados e radioatividade
Tu não culparás apenas uma empregadinha de loja.
Que como toda empregadinha de loja sonhou ser estrela de cinema.
E o sonho foi realidade (mas como a realidade do technicolor).
Ela apenas representou de acordo com o script que lhe demos
--O de nossas próprias vidas-- E era um script absurdo.
Perdoa-lhe Senhor e nos perdoa
por nossa 20th Century
por esta Colossal Super Produção em que todos trabalhamos
Ela tinha fome de amor e oferecemos tranqüilizantes.
Pela tristeza de não sermos santos
recomendamos a Psicanálise.

Lembra-Te Senhor do seu crescente pavor da câmara
E seu ódio à maquilagem – insistindo em maquilar-se a cada cena –
e como se foi fazendo maior o horror
e maior a impontualidade nos estúdios.

Como toda empregadinha de loja
sonhou ser estrela de cinema.
E sua vida foi irreal quanto um sonho que um psiquiatra interpreta e arquiva.

Seus romances foram um beijo com os olhos fechados
que quando se abrem os olhos
descobrem-se embaixo de refletores
e os refletores se apagam.

E as duas paredes do quarto se desmontam (eram um set de cinema)
enquanto o Diretor se afasta com suas anotações
porque a cena já foi rodada.
Ou como uma viagem de iate, um beijo em Singapura, um baile no Rio
a recepção na mansão do Duque e da Duquesa de Windsor
vistas da sala do apartamento miserável.
O filme acabou sem o beijo final.
Acharam-na morta em sua cama com a mão ao telefone
E os detetives não souberam a quem ia chamar.
Foi
como alguém que discou o número da única voz amiga
e ouve apenas a voz de uma gravação dizendo: WRONG NUMBER
Ou como alguém que ferido pelos gangsters
estende a mão para um telefone desligado.
Senhor
quem quer que tenha sido a quem ela chamava
e não chamou (talvez ninguém
ou era Alguém cujo número não se encontra na Lista de Los Angeles)
atende Tu ao telefone.


quarta-feira, 16 de junho de 2010

Deus e o Diabo

“Deus, para a felicidade do homem, inventou a fé e o amor. O Diabo, invejoso, fez o homem confundir fé com religião e amor com casamento.” 


“Será que todas estas moças estão se casando com imbecis?” O meu azar é que morávamos defronte a uma grande igreja, onde aos sábados os casamentos se sucediam, com lindas noivas, em lindos vestidos brancos, exibindo sua virgindade (que nesta época era pra valer). Nunca entramos num acordo meu pai e eu. Militar, engenheiro, gaúcho macho da fronteira, Felippe, jamais entendeu que um dos maiores beneficiados era ele mesmo. Tentei fazê-lo entender que amor e casamento não tinham nada a ver e que ao não ligar para este ato burocrático, eu o estava ajudando a fazer uma imensa economia, que poderia ser gasta em coisas mais interessantes, como uma viagem a Paris.

Afinal, eu era filha de um General, e, logo, meu casamento não poderia ser qualquer coisinha. Imagino que naquele tempo poderiam dizer que eu me casava grávida, coisa horrível, ou, menos horrível, que meu pai era um sovina. Vejamos então os gastos, sempre altos, para a patente de uma filha de General. Primeiro, havia o célebre enxoval, que, tenho certeza interessaria à maioria de minhas amigas da época, todas antenadas no “desencalhe”. Milhões de toalhinhas inúteis, toalhas, colchas, mantas, enfim um arsenal capaz de cobrir um batalhão. Quem sabe até me fosse cobrada uma exposição? E o vestido de noiva, que deveria ser lindo, como o das moças que me eram mostradas como modelos. E havia ainda a grinalda, o buquê, sapatos especiais. Sem esquecer o véu. E a ornamentação da igreja. E as roupinhas da daminha, que certamente seria Ludmila, minha sobrinha, que odiaria esta função e também, certamente, a roupinha. E haveria também a roupa da mãe da noiva, e a do pai. E se não houvesse festa, muita gente se consideraria ultrajada, e sairia falando cobras e lagartos. Se houvesse, idem. E como tínhamos, meu pai e eu, uma profunda incompatibilidade quanto aos meus pretendentes, este item sempre foi supérfluo.

E pasmem, Felippe odiava todas estas solenidades, e só se casara no civil. E ainda por cima, era agnóstico, ou ateu, não sei bem. Meu pai, pena, foi vítima do “politicamente correto”, em que uma moça deve casar. Como diz Simone de Beauvoir, no seu inigualável “Segundo sexo”, as mulheres casadas gozam de maior prestígio do que as solteiras. Ele sabia disso e talvez temesse me deixar trilhar meu próprio caminho, como eu pretendia fazer, e fiz. O livro foi escrito em 1947, mas ainda hoje persiste na cabeça de muita gente esta crença profunda, que, por ser crença, é quase inextirpável.

Rompi, e espero haver rompido, de fato, com todo tipo de preconceito. Orgulho-me em dizer que tinha um bisavô mulato, uma avó cabrocha, que não sou casada, e pretendo nunca me casar, mas que vivo com o homem que escolhi livremente. E que temos uma relação absoluta igualitária, onde dividimos deveres, despesas e, evidentemente, prazeres. Que tenho queridos amigos homossexuais. Meu último rompimento com o que não me diz respeito aconteceu quando perdi minha única irmã, último membro de minha família original. Com meus sobrinhos, decidimos que não havia necessidade de “missa de sétimo dia”. Reunimos amigos, alguns deles religiosos, falamos do que significa esta dolorosa separação, a morte, que nos aguarda a todos. Li um texto em sua homenagem, onde falava de minha dor e saudade. Mas também rimos nos lembrando de bons momentos vividos juntos, e até fizemos um lanche preparado por suas filhas e noras. Porque eu sabia que Teresa estava bem, e está. Talvez conosco naquele momento, também recordando. Porque tenho fé. Fé que me segurou nos momentos de dor por que todos nós passamos e que me dará forças até o final.

Mas sem religião. Nem casamento.
A frase acima é de Machado de Assis, mas disse-me um amigo que se inspirou em Shakespeare.