QUEM SOU EU

Sou professora de Francês, mas hoje minha principal atividade é escrever e ler, além de cuidar dos meus três vira-latas: Charmoso, Príncipe e Luther.



Gosto de fazer ginástica, sou vegetariana e adoro animais em geral, menos baratas.



Sinto especial prazer quando meus textos agradam aos meus leitores. Espero continuar produzindo e me comunicando com todos os meus amigos, neste maravilhoso universo da net.



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segunda-feira, 26 de novembro de 2012

Receita para ser feliz

É verdade que tenho estado particularmente feliz nestes últimos tempos, apesar das múltiplas preocupações. Obama venceu, os mensaleiros estão sendo julgados e condenados. Rui Falcão , aquela mistura pra lá de indigesta de Stalin com Goebbels - o ministro da propaganda nazista que dizia que uma mentira, a força de ser repetida infinitamente, acaba como verdade- está sendo denunciado, juntamente com o chefe, sobre a farsa do relatório final da CPI do Cachoeira, que deixou de lado notórios pilantras como o governador do Rio de Janeiro, um tal de Sérgio Cabral Filho. Dilma compareceu sorridente  à posse de Francisco Barbosa. E ainda umas outras pequenas cositas. Tenho a alegria de dizer que o homem mais poderoso do mundo e o mais respeitado do Brasil são negros. Negros como aquele meu antepassado lá do século 19, cuja fotografia guardo como recordação de família e como troféu de minha miscigenação. É a minha gota de sangue.
Mas, afinal, esta não é a receita para uma felicidade existencial. E ela existe? Lembrei-me disso ontem à noite, quando as nove e meia  fui me deitar para dormir daí a meia hora, já com o celular marcado para as cinco da manhã de hoje, amanhã, depois, depois e depois. Este é um dos princípios de minha receita de felicidade. Lembrei-me ao pensar em uma amiga que tem a sua e que não admite a minha. Bobagem, nós, humanos, somos tão infinitamente diferentes uns dos outros que decidi não discutir, lembrando-me de meu pai que dizia só discutir coisas inteligentes.
Houve um tempo, não muito distante, que para ser feliz uma mulher precisa casar-se. Não precisei. Outras precisaram.  Precisava procriar. Não precisei. Outras precisaram. Eu ainda não conhecia Simone de Beauvoir, mas tinha conceitos meio confusos acerca do que poderia ser a “minha” felicidade. Amei, tive paixões fulminantes, esqueci-os, ainda olho com saudades aqueles meus anos dourados, mas não quero nostalgia. Não imagino a felicidade numa cidade violenta, não imagino a felicidade baseada em constantes viagens, em compras, em luxo. Mas outras pensam assim, porque, afinal, somos infinitamente diferentes. Imagino a felicidade como uma grande, enorme liberdade. Aquela liberdade que Deus nos deu e que, mesmo que tenhamos escolhido a submissão, foi  responsável pela nossa escolha. Deixei de ter pena de fulana ou beltrana, que não deu certo na vida, tendo todos os membros no lugar, uma cabeça pensante e condições mínimas. Irrita-me ouvir “Coitada de Fulaninha!” Fiquei má. Acredito na liberdade, aquela que nos permite fazer qualquer escolha, desde que não cause dor a outro, que, aliás, tem a liberdade de defender-se. Quero ser livre, e peço todos os dias a Deus que morra no sono, como os bem-aventurados. Talvez sonhando com outro mundo, onde dizem que há uma paz tão profunda, como jamais experimentaremos aqui.
Como ser humano, posso ter o homem ( ou a mulher)  que quiser, e me quiser, sem nenhuma espécie de preconceito, mas quero a minha liberdade para escolher meu futuro e evoluir naquilo que para mim é importante. Sou uma individualidade, capaz de dar conta de minha vida, livre para viver no mato, no Rio, em Paris, livre para viver como quiser e onde quiser,... sendo feliz.
E madrugadora.  

sexta-feira, 2 de novembro de 2012

Requiem pour Bibi


Conheci Bibi dentro de um caixãozinho branco, recoberto de véu também branco. Ao lado do seu rosto, como se dormisse com ela, sua bonequinha de pano que a acompanhava desde sempre. Nas mãos cruzadas onde se via um terço branco, se destacavam as unhas pintadas de rosa-pink. Tive vontade de beijar seu rosto, mas senti uma censura dentro mim. Ao invés disso, beijei suas mãozinhas geladas pela morte. Meu réquiem sem música era, no entanto, verdadeiro. Havia uma criança morta, aos oito anos, feitos alguns dias antes. Não contive as lágrimas, como a maioria das pessoas que ali estavam. Abracei e beijei a mãe, que mostrava no rosto o sofrimento de mais de dois anos de luta contra um câncer que, afinal, levara sua Bibi. Seu rosto, apesar do sofrimento, sorria, e mostrava simultaneamente a dor e a serenidade de quem lutou até o fim. O pai tinha a mesma expressão de dor, mas mostrava calma. Ambos haviam, naqueles quase três anos, dedicado suas vidas à filha, que sabiam irremediavelmente condenada.
Por que aos oito anos, depois de tanto sofrimento, Beatriz partira? Inexplicável. Como diz o Eclesiastes:
Há um momento para tudo e para todo propósito debaixo do céu.
Tempo de nascer,
E tempo de morrer;
tempo de plantar,
e tempo de arrancar a planta.
................................................
Tempo de chorar,
e tempo de rir;
tempo de gemer ,
e tempo de bailar.
.................................. “

Bibi deve ter cumprido seu tempo. A plantinha tenra foi arrancada. Mas foi tão breve seu tempo! Foi arrancada dos braços amorosos de seus pais, avós, mas foi recebida nos braços de Deus, criaturinha sem pecados.
Foi aos meus oito ou nove anos,  que vi, pela primeira vez, uma criança morta. Era um menino e deveria ter cinco ou seis anos. Foi numa casa pobre num bairro popular, uma daquelas construções de duas janelas que dão diretamente sobre a rua. Havia morrido de alguma doença na cabeça, quem sabe hidrocefalia. Tinha a cabeça enorme, descomunal para seu corpo que parecia ser miúdo. Uma cor amarelada, doentia, que mesmo a mim, criança, impressionou. Ficamos debruçadas na janela olhando, minha amiguinha e eu. Alguém depois nos disse do que morrera, mas não guardei na memória, é claro. No entanto, aquela imagem da criança morta, nunca mais esqueci. Muitos anos depois, vi o neto de uma amiga dentro de um pequeno caixão, depois de uma longa luta contra a leucemia. Tinha dez anos.
E ainda diz o Eclesiastes:
“....Também colocou no coração do homem o conjunto do tempo, sem que o homem possa atinar com a obra que Deus realiza desde o princípio até o fim....”

Temos todos o nosso tempo, de chorar de rir, de gemer e de calar. E de morrer. Mas não podemos atinar com a obra de Deus.