QUEM SOU EU

Sou professora de Francês, mas hoje minha principal atividade é escrever e ler, além de cuidar dos meus três vira-latas: Charmoso, Príncipe e Luther.



Gosto de fazer ginástica, sou vegetariana e adoro animais em geral, menos baratas.



Sinto especial prazer quando meus textos agradam aos meus leitores. Espero continuar produzindo e me comunicando com todos os meus amigos, neste maravilhoso universo da net.



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segunda-feira, 21 de outubro de 2013

Mes temps révolus

Quando me olho no espelho, vejo no meu rosto marcas inevitáveis do tempo e de minha história. Elas não me trazem tristeza, nem a angústia de saber , como diz Mário de Andrade, que tenho mais passado do que futuro e meu cesto de jabuticabas está ficando meio vazio. Além da saudade dos que se foram, cumprindo seu tempo, uma pontinha de saudosismo gostoso de uma época que desapareceu. Tempos de brincadeiras já esquecidas no passado. Naquele tempo, morava numa vila quase exclusivamente de militares. Meus amiguinhos vinham de lugares diferentes, mas tínhamos em comum a infância colorida. Nossos pais tratavam a nós, como ao resto da família, como um regimento de recrutas. Em minha casa só uma pessoa se insurgia, minha avó materna, Joana, sogra e tia de meu pai, que exigia um tratamento pelo menos de 1º. Tenente. Era a querela das patentes. Meu tio Armando, também militar, usava do mesmo rigor. E afinal, aquela disciplina nos foi benéfica. A noite, brincávamos de roda, de esconde-esconde, de chicotinho queimado, de estátua, que eu sempre perdia, pois jamais consegui parar momentaneamente  à ordem: “ estátua”. Aí emburrava e não queria mais brincar. Em compensação, era a campeã da corda, pulava com até duas e nunca deixava de levar minha amiga para o colégio. Mas, houvesse o que houvesse, às oito e meia ou nove horas, não me lembro bem, como um regimento obediente, voltávamos todos para casa.
E havia também código referente ao sexo, que devia ser mantido em segredo. Eu devia ter uns cinco ou seis anos. Ouvindo aqui e ali conversas de minha mãe, não podia compreender como minha Dindinha, que era jovem, não era “moça” e Alzira, que era velha era “moça”. Curiosa, perguntei a minha mãe o porquê e ela simplesmente me respondeu: “Porque Dindinha é casada”. Fiquei ainda mais confusa, sem conseguir estabelecer a relação entre uma coisa e outra. E falava-se também da mulher que havia se perdido. Eu a imaginava perdida numa rua escura, sozinha, com medo. E jurei que nunca me perderia. A mulher que havia se perdido era vítima de uma homem perverso que lhe fizera “mau”. Um dia vi um homem que diziam haver feito “mau”, a uma moça, e olhei-o com um misto de medo e respeito. Tudo que envolvia estas histórias excitava nossa sexualidade nascente. Não nos instruíam acerca de nada e formávamos idéias escabrosas, que nos amedrontavam e fascinavam acerca da sexualidade. E havia ainda a história da “mulher livre”, que , evidentemente, se opõe a “mulher escrava”. Muitos anos depois fui acusada de ser uma “mulher livre”, e gostei! Nunca suportaria ser escrava! E tantas outras bobagens que ouvíamos e que só serviam para alimentar nossas fantasias!

Mudou o mundo, mudei eu! Podemos ser amantes, perdidas, não existe mais o homem que nos tenha feito “mau”, não há a dicotomia moças /mulheres, somos todas mulheres, com plenos direitos sobre nossa sexualidade. Foi-se a roda, a corda, o chicotinho queimado, o esconde-esconde. Chegamos à era cibernética, meus netos ririam se eu lhes contasse todas estas histórias. Mas, afinal, perdemos ou ganhamos? Drogas rolam soltas, estupros aos montes, assaltos a todo instante! E a obesidade que atinge até crianças com colesterol alto! Exercitávamos-nos nas brincadeiras, e assim crescemos mais saudáveis. Francamente , aquele mundo reacionário não me seduz, mas , como já disse, aquela   pontinha de saudosismo nunca desaparecerá.

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