QUEM SOU EU

Sou professora de Francês, mas hoje minha principal atividade é escrever e ler, além de cuidar dos meus três vira-latas: Charmoso, Príncipe e Luther.



Gosto de fazer ginástica, sou vegetariana e adoro animais em geral, menos baratas.



Sinto especial prazer quando meus textos agradam aos meus leitores. Espero continuar produzindo e me comunicando com todos os meus amigos, neste maravilhoso universo da net.



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segunda-feira, 1 de setembro de 2014

Somos todos macacos

Tenho alguns parentes, lá pelo sul, que se dizem brancos. E até parecem. E como todos os brasileiros velhos falam de uma antepassada índia, que foi laçada por um branco e daí surgiu a família. Folclore... Como dizia José Wilker, se não me engano na mini-série “Brado Retumbante”, “somos uma nação mulata”. Somos daquele grupo que, nos períodos mais negros da segregação americana, tinha a “gota de sangue”, ainda que aparentemente fosse mais branco que o Lula. Mestiça sou eu, minha vizinha, meu pai, o Prefeito, o Delegado. Mestiço é o vizinho metido a besta, o gari, meu homem, meu amigo. Mestiços somos todos, excetuando-se algumas colônias no sul, e que já começam a se miscigenar.
E viva este colorido, que nos dá força para enfrentar tanta coisa! Dá ao povão saúde para enfrentar o SUS- é claro que ninguém é de ferro -, para tomar o ônibus super lotado, cheio de micróbios. Este colorido que dá a nós, mulheres brasileiras, a bunda que encanta os gringos, cujas mulheres são tão falhas neste item! E não nos queixamos, ainda que sejamos os campeões da hiperlordose. É esta miscigenação que permite a mim, como a muitas outras mulheres brasileiras driblar o tempo. Eu que tive um bisavô mulato, uma avó cabrocha e um avô descendente de alemães. Misturar, dar aquele tempero especial que faz com que sejamos tão encantadores para os gringos (ainda que eles desconheçam nossos bastidores!). É dar aquele tempero que faz com que a comida da mamãe tenha um sabor tão especial! É a pimenta, o alho, o cuminho, a raiz forte...  É o Brasil no que ele tem de bom!
Meu sobrinho Bertrand teve que arrancar alguns dentes e colocar aparelho. Havia dentes sobrando para sua arcada branca. Negros têm dentes maiores e lindos! O mesmo aconteceu com Felipe, filho de minha sobrinha Ludmila. Tenho um dente um pouco proeminente, o que alguém já me disse que é charmoso – que bom-, porque não arranquei o que sobrava. Tenho uma mancha na perna, Felipe idem, ambas diagnosticadas como mistura racial.
Onofre, meu bisavô, e seus antepassados estão presentes em mim e em toda a família. Onofre tinha uma mãe negra, e um pai branco. Sinto especial prazer em imaginar essa tataravó negra como um tição, com aquele corpo sinuoso, que, graças a Deus, eu como sua descendente , herdei. Com aquele cheiro de canela, que tanto louva Jorge Amado. Gosto de imaginá-la no seu andar sensual, na sua ginga que encantou o homem que a fez mãe de seus flhos.

 O fenômeno racista é muito antigo. No princípio éramos todos macacos. Pouco a pouco viramos gente. Ficamos aparentemente diferentes. Razões desconhecidas nos levaram a raças diversas. Razões conhecidas nos levaram a explorados e exploradores. Mas para mim, e para milhões de outras pessoas, felizmente, aquela mulher com cara de Arlequim jamais vai significar nada além de mais uma. Jamais terá o cheiro de canela, nem o corpo sinuoso, nem a pele resistente ao tempo, nem a sensualidade que se expande em nós. Será sempre, apesar de mestiça, uma cara de Arlequim, que só se fez notar pelas caretas.  

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