QUEM SOU EU

Sou professora de Francês, mas hoje minha principal atividade é escrever e ler, além de cuidar dos meus três vira-latas: Charmoso, Príncipe e Luther.



Gosto de fazer ginástica, sou vegetariana e adoro animais em geral, menos baratas.



Sinto especial prazer quando meus textos agradam aos meus leitores. Espero continuar produzindo e me comunicando com todos os meus amigos, neste maravilhoso universo da net.



Seguidores

sexta-feira, 27 de outubro de 2023

 Uma criança brasileira em Paris

Lembro-me do dia em que meu pai chegou em casa, exultante, e nos disse que íamos para a França. Ele era engenheiro militar , dava aulas no IME, e havia ganhado uma bolsa para Paris! O ano era 1956, não me lembro o mês. Eu tinha 10  anos e nenhuma noção do que fosse exatamente  este país. Um ano antes, havia vindo ao Brasil a atriz Martine Carol e seu marido, um diretor chamado Christian Jacques. Martine Carol se tornara famosa por haver sido a primeira mulher a expor os seios na tela . Era jovem, loura e linda , com corpo voluptuoso. Vi embevecida a entrevista , sem entender bulhufas e admirada em pensar que alguém pudesse se comunicar naquela língua! Isto cerca de um ano antes do anúncio de meu pai !
Quando fiquei sabendo que ia para a França, passei a brincar de cantora, pegava uma vassoura que fingia ser um  microfone, Inventava uma língua , e cantava uma melodia que me saia da cabeça  Mas antes de minhas "melodias" em língua desconhecida, eu gostava  de brincar de "moça" , o quê deixava minha irmã furiosa.  Punha seus saltos altos, brincos, passava batom, e andava pela casa, ou fingia que tomava chá com amigas. E ,evidentemente, além das bonecas, tão raras hoje em dia. Havia a Holandesinha, Susy, Débora,e um bebê , de cujo nome não me lembro mais , e que, provavelmente havia pertencido a  Teresa. Quando minha mãe me dava uns trocados , corria até uma loja onde vendiam retalhos e voltava para fazer novos vestidos. E também gostava de minha bicicleta. E de  pular corda, que levava para o colégio. E da merendeira que cheirava a coisa velha e que eu herdara de Teresa. Era dia de festa quando podia comprar um cone onde havia uma surpresa. Enfim, tudo muito singelo. Nunca consegui ganhar a casinha de bonecas com que sonhei tantos Natais, mas me sentia feliz com a mobilinha  de plástico rosa em que havia uma penteadeira, uma cama , e um armário. Havia também uma sala de madeira que eu reservava para as visitas. Armava tudo num canto de um cômodo vazio da casa.
Pois naquele dia, de 1956, tanta coisa que me fascinava devia ficar para trás ! Holandesinha, Susy , Débora e o bebê não poderiam ir comigo. Nem minha mobilinha de plástico, nem a da madeira, Nem minha bicicleta. Não me lembro se chorei, acho que fiquei alerta para a experiência que se abria diante de mim. Viajamos pela falecida Panair . Viagem longa , de não sei quanto tempo. Paramos em Dakar, capital do Senegal, e quando descemos do avião, tive a impressão de haver penetrado num forno. Negros vestidos a caráter, acho eu , nos esperavam e nos ofereciam água de côco bem gelada. Lembro-me de que no mesmo avião viajava Carmélia Alves, e seus músicos para uma turnê na Europa. E há pouco tempo atrás, vi no Youtube, um canal que trata das antigas cantoras do rádio. E lá estava ela, em boa forma. É claro que se tratava de uma gravação antiga. Havia outras também, de minha infância, como Carminha Mascarenhas. Mas, tudo isto ficou no passado, um passado bom, que gosto de recordar.
Na França, estavam nos esperando outros militares brasileiros. Eu era a única criança, já que fui filha temporona. O aeroporto era Orly, Charles de Gaulle ainda demoraria muito. Já haviam feito reserva em um hotel , justamente no 17e. arrondissement, onde viríamos a  morar. Ficamos em dois apartamentos diferentes e fiquei feliz com a banheira , onde poderia brincar de lanchonete, fazendo milk-shakes de espuma. Mas e depois?  Todos haviam voltado para casa, e nós estávamos com fome. Sem conhecer a cidade, meu pai se muniu de uma mapa e rumamos em direção aos Champs Elysées. Mas, antes de chegarmos lá, quero lembrar da garota francesa, mais ou menos de minha idade, que passou por nós conversando com alguém que devia ser sua mãe.  Fiquei extasiada!   Como era possível? Mas , ao mesmo tempo me convenci de que seria capaz de fazer o mesmo.
Subimos a Avenue Mac-Mahon, que foi Presidente da França no século XIX, e logo vimos aquele monumento imenso , todo iluminado, com a bandeira francesa tremulando do alto. Agarrada no braço de minha mãe, fizemos uma volta, passando por palacetes que rodeavam a monumental praça, nesta época chamada Place de  l'Etoile.  Enfim, após quatro avenidas penetramos naquela mil vezes iluminada, que parecia não ter fim. Não me lembro de minha reação após tantos anos, mas devo ter achado  estar noutro mundo.  Tantas vezes voltei lá, mas estou certa de que  jamais tornei a sentir aquele "frisson" daqueles meus  longínquos dez anos. Meu pai escolheu , ao acaso, um restaurante que me pareceu lindo e que nunca mais reencontrei . Comi um bife com um molho que meu pai disse ser de mostarda e manteiga, com fritas. Devo ter tomado Coca- Cola e alguma sobremesa "superbe ". Exaustos, voltamos para o hotel e dormimos......
O resto conto logo mais.  


Nenhum comentário: