QUEM SOU EU

Sou professora de Francês, mas hoje minha principal atividade é escrever e ler, além de cuidar dos meus três vira-latas: Charmoso, Príncipe e Luther.



Gosto de fazer ginástica, sou vegetariana e adoro animais em geral, menos baratas.



Sinto especial prazer quando meus textos agradam aos meus leitores. Espero continuar produzindo e me comunicando com todos os meus amigos, neste maravilhoso universo da net.



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terça-feira, 20 de outubro de 2009

Lá se foi Mercedes...

Há alguns dias morreu Mercedes Sosa, musa de uma geração que sonhou com um mundo melhor. Mas este sonho já faz muito tempo! Longínquo tempo! Não direi, como Cazuza, que nossos heróis morreram de overdose. Nossos heróis morreram de velhice, de inanição, provocada pela nossa descrença. Morreram de morte lenta, nos nossos corações e mentes, levados pela nossa dolorosa queda no mundo real. Levamos um susto ao confrontar heróis que se transformavam em vilões. Ídolos que, de repente, caiam como aquela estátua de Lênin, na Praça Vermelha. Mas no meu coração, no entanto, guardo a voz forte, a figura linda de índia poderosa daquela mulher que cantava as coisas que gostaria de poder cantar. Puro encantamento, durante horas, enquanto a ouvia com amigos.
Naquele tempo, quando acreditávamos nestes sonhos, Fidel, com sua incontestável sedução, nos parecia uma figura messiânica, a imagem do Cristo-Chê nos embalava e nos dizia que ele, afinal, morrera por uma causa nobre, e as imagens que nos chegavam de Lênin, meio borradas, discursando com gestos dramáticos para uma classe operária que se libertava da secular opressão, nos empolgava. Éramos jovens, e o que seria da juventude se não sonhasse? No Brasil, surgia o movimento dos sem-terra, escravos da gleba, reivindicando o que lhes fora furtado, um pedaço de chão, onde pudessem fazer mais do que deixar apodrecer a carcaça maltratada, como diz o poema de João Cabral. Vivíamos sob uma ditadura, nojenta, como hoje sei que são todas as ditaduras. Mas nós víamos o mundo de forma maniqueísta, dividido em direita e esquerda, em oprimidos e opressores. E tínhamos uma esperança, a de que aquela ditadura, como, aliás, acontece com todas, um dia apodrecesse.
Naquele tempo, Lula e sua turma de metalúrgicos não era conhecida, poucos sabiam de sua existência. Nem se sonhava com um partido de trabalhadores. Mas quando ele surgiu, consideramos um grande avanço. E poderia ter sido! Acreditamos na sua singela honestidade, como acreditamos no movimento dos sem-terra, na Teologia da Libertação, nas pastorais. E pouco a pouco, como a ditadura, tudo aquilo foi apodrecendo. Lula, cuja eleição aplaudimos, mesmo que muitos de nós não acreditasse mais nos velhos sonhos, mas acreditando na sua sinceridade, mostrou-se um populista barato, capaz de qualquer coisa para manter o poder para seu grupo. O movimento dos sem-terra transformou-se em um movimento marginal, para o qual não existem limites, que age à margem da lei, acobertado pelo governo, que, por baixo dos panos, passa milhões aos seus chefes. E onde foi parar a Teologia da Libertação? O que vemos são Betos e Boffs, para a maioria de nós, totalmente desacreditados. E Pastorais, como a indigenista, estimulando os índios à rebeldia sem nenhuma responsabilidade quanto a seu futuro? Todos estes cooperaram para que gente como Ronaldo Caiado e Kátia Abreu, merecessem o nosso apoio, ou melhor, o apoio de gente que, como eu, já não vê o mundo em preto e branco. Gente que já passada nos anos, abandonou os sixties, e se considera já velha para ilusões perdidas.
Gostaria de poder dizer que meus heróis não morreram, que sempre viverão nos meus sonhos. Mas dos meus sonhos, daqueles de outrora, surgiu gente como Chávez, Corrêa, Morales, os Kirchner, ou aquele da Coréia do Norte, cujo nome não interessa. Quando vejo cenas como a da destruição das plantações de laranjas, sem que tenha havido qualquer punição, quando ouço Boff dizer, respondendo a um jornalista, que o fim do comunismo significou o fim das esperanças para os “excluídos”, quando vejo gente como o assassino Battisti ser defendido pelo Ministro da JUSTIÇA (!), sinto que aquilo com que toda uma geração sonhou apodreceu. Quando vejo tudo que se passa à minha frente, sinto medo do que poderá vir. E se isso significa ser da direita, confesso que me converti, mudei de lado.
Mas daquele lado, lá de longe, do meu passado, restou a voz forte e quente de Mercedes Sosa, inesquecível musa, em quem sentíamos o calor de um coração sincero.
Saudades da inocência, dos sonhos antigos, da juventude. Saudades de Mercedes.

2 comentários:

Ricardo Vélez-Rodríguez disse...

Gatinha, o que se passou contigo e comigo foi em tempos diferentes, mas na mesma direção. Digamos que, como a Colômbia, eu antecipei o que ocorreria no Brasil. O famoso efeito orloff. Deixei de acreditar nas coisas do messianismo esquerdista muito cedo. E hoje vejo - não gostaria de constatar isso - que os meus alertas, em relação ao populismo petista, tinham fundamento. A bem da verdade, jamais acrditei em Lula. Rejeição intuitiva. Bom, mas também, na minha época de contestação, também sonhei embalado pela "Negra", como a chamavam carinhosamente os chilenos. "Yo quiero que a mí me entierren, como a mis antepasados, en el fondo oscuro y fresco de una vasija de barro". Bela poesia de quem se tornou expressão da rebeldia ameríndia nos sixties...

Guacira Maciel disse...

Ah!... nossos heróis morreram de cansaço e desalento; morreram, porque morreram-lhes a esperança de um tempo humano melhor...
Abraço, Guacira.
www.gpoetica.blogspot.com