QUEM SOU EU

Sou professora de Francês, mas hoje minha principal atividade é escrever e ler, além de cuidar dos meus três vira-latas: Charmoso, Príncipe e Luther.



Gosto de fazer ginástica, sou vegetariana e adoro animais em geral, menos baratas.



Sinto especial prazer quando meus textos agradam aos meus leitores. Espero continuar produzindo e me comunicando com todos os meus amigos, neste maravilhoso universo da net.



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domingo, 30 de março de 2008

ECOS DO PASSADO -1

Minha avó Conceição, mãe de meu pai, foi uma mulher que merece ser lembrada, ainda que quase nada se fale dela na família. Conceição foi quase esquecida e dela não restou nenhuma foto jovem. Não sei como se parecia. Foi uma mulher que viveu fora de seu tempo, que ousou, mas cuja ousadia, infelizmente, não teve o respaldo da variável econômica, aquela que, segundo Marx, condiciona todas as outras. Ou seja, minha avó não tinha, como todas as mulheres de sua época, independência econômica, a única que nos permite total liberdade.
Pertencia, por parte de mãe, a família tradicional paulista, Almeida Prado. Seus antepassados haviam migrado para o sul do país, para estabelecimento de estâncias, numa época em que as terras devolutas abundavam. Por lá se fixaram, mas formaram uma espécie de elite fundiária, onde se falava francês, comia-se em pratos de porcelana inglesa e tomava-se vinho ou água em recipientes de cristal. A região era a da fronteira oeste do Rio Grande do Sul, rústica, que tem a vizinhança da Argentina. Uruguaiana deveria ser na época uma cidadezinha totalmente insignificante, - e ainda é-, mas por onde corria muito dinheiro, oriundo, sobretudo, da venda de gado.
Nada sei do pai de minha avó, a não ser que tinha o sobrenome Noronha. É figura totalmente apagada. Já a mãe, parece que viúva bem jovem foi uma mulher enérgica, que dirigiu os negócios da família com mão firme e morreu relativamente cedo. Sendo Buenos Aires mais próximo do que Porto Alegre, Conceição criou-se freqüentando a capital argentina, indo a teatros, assistindo a concertos, havia estudado piano desde criança com professores importados de Porto Alegre. Falava espanhol fluente, o que não é tão raro por aquelas bandas. Mas também lia francês e inglês. E lia sofregamente tudo que lhe caia nas mãos, romances, livros de divulgação, almanaques. Tenho dela, uma única lembrança, folhetins de “La mode illustrée”, que contam histórias de amor em capítulos, cuidadosamente colecionados e belamente encadernados, vindos diretamente de Paris.
Conceição casou-se cedo com o filho de um estancieiro. Chamava-se Felippe, era o pai de meu pai. Tiveram quatro filhos, todos homens. Mas Felippe morreu cedo, aos trinta e três anos. Deixou-a viúva aos vinte e nove anos. E ávida por viver. E foi assim, pouco tempo depois de viúva, que conheceu um ator. Creio que foi em Porto Alegre, já que o dito fazia parte de uma companhia de teatro portuguesa, de cujo nome jamais me esqueci: “Maria Malta”. E apaixonou-se perdidamente. Por ele enfrentou a família, o filho mais velho, os amigos, os preconceitos. Imaginem só! Casaram-se, apesar de tudo. Foram morar em Porto Alegre. Logo depois, ela engravidou e teve uma filha, Maria, que morreu aos doze anos, uma história que já contei aqui. O que Conceição não sabia é que seu homem era um ex-alcoolatra, que pouco tempo depois voltou ao vício. E aí se instalou o inferno na sua vida. Censurada por todos, pela família, pelos amigos e, sobretudo, pelos filhos, ela decidiu separar-se do único homem que amara de fato. Ele voltou para o Rio, para sua Companhia de teatro. Algum tempo depois, sem conseguir superar a paixão, Conceição, acompanhada de um filho doente, seguiu para o Rio. Lá viveu algum tempo, até que não pode mais suportar e voltou para o sul.

O resto da história, eu conto depois.

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