QUEM SOU EU

Sou professora de Francês, mas hoje minha principal atividade é escrever e ler, além de cuidar dos meus três vira-latas: Charmoso, Príncipe e Luther.



Gosto de fazer ginástica, sou vegetariana e adoro animais em geral, menos baratas.



Sinto especial prazer quando meus textos agradam aos meus leitores. Espero continuar produzindo e me comunicando com todos os meus amigos, neste maravilhoso universo da net.



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segunda-feira, 18 de dezembro de 2023

 La plus grande  horizontale du XIX siècle

Antes de falar destas mulheres que venderam seus corpos, para comprar sua LIBERDADE, é preciso se reportar a esta sociedade patriarcal , existente no século XIX, em que a mulher só existia para os afazeres domésticos, ou para procriar. Os salários  eram irrisórios e se quisessem seguir sua vida sozinhas, só lhes restava duas  opções : a vida  miserável, como vimos que acontecia com as "vendeuses" , obrigadas a um trabalho forçado de 14 horas, de pé , ou à prostituição. Isto quando tinham a sorte de ter atributos físicos. Aliás, esta profunda desvalorização da mulher vem de tempos muito antigos,  mesmo na Grécia de grandes pensadores , artistas e arquitetos , a mulher era confinada ao Lar, chamado Gineceu. O exemplo bíblico da mulher adúltera é sinalizador desta anomalia; ela deveria ser apedrejada , mas não o seu amante. 

Enfim, para não me alongar numa enorme lista de discriminações , vou começar a falar destas que optaram por outra coisa. E tenho certeza, de que, no  século XXI , ninguém pensará que se trata de apologia à prostituição. Aliás, me orgulho de haver sido sempre, ao longo da vida, uma mulher  independente, vivido de meu trabalho honesto e eficiente, procurado sempre me alçar ao mais alto, sem depender de casamento, o quê me rendeu sérios embates com meu pai. Não vou dizer "uma mulher livre", porque já fui pejorativamente assim qualificada.

A primeira destas mulheres, denominadas "cocottes", "mondaines", "horizontales" chamava-se Thérèse Lachmann,  judia, nascida em 1819, num gueto de Moscou.   Era filha de um miserável vendedor de retalhos velhos , que para assegurar-lhe , talvez, um futuro mais estável, mandou batizá-la cristã. Ainda muito jovem, seu pai resolve entregá-la a um pobre  alfaiate, francês, que , tendo em vista sua pobreza, era obrigado a morar naquele gueto  judeu. Um ano depois, Thérèse , continua na miséria, trabalhando na casa e cuidando de uma criança .Um belo dia, enquanto o filho dorme e o marido trabalha, ela embrulha suas poucas roupas num pedaço de pano e segue adiante. Mulher corajosa, ciente dos perigos que corria  uma judia naquela Rússia czarista, onde existiam pogroons ( ataques a Judeus ), como a Noite dos Cristais na Alemanha Nazista. Pretende atravessar a fronteira , que jamais mencionará qual, vivendo de seu corpo. Chega a Constantinopla , execrada por todos , e segue sempre. Enfim, vendendo-se pelo caminho, chega a Paris, onde procura comida e um lugar onde possa descansar seu corpo exausto, não importando quão sórdido  fosse. No quartier Saint- Paul, há muitos judeus , que a fazem lembrar o miserável gueto de sua infância, que deixara para trás.  

Como diz um de seus biógrafos Pierre Dominique: " Thérèse , só tem seu corpo para escapar do quartier Saint -Paul. E ela usou. Duro ofício . Numa noite gelada de dezembro, pobre prostituta, com um roupa inadequada e sapatos furados , sem haver nada comido, ela desce os Campos Elíseos e desmaia num banco." O que ela ignora é que este Jardin d`hiver, diante do qual caiu, em alguns anos, será demolido e em seu lugar, construído um magnífico palácio, SEU, que ainda hoje existe na famosa avenida, e cujo luxo nababesco  atrai especialistas.( Uma visita pode ser vista no canal do YOUTUBE "Les Trésors des Hôtels Particuliers")

A história de  Thérèse é longa e cheia de infortúnios e glórias.   Com o dinheiro economizado, com sua beleza, carisma, e aguda inteligência atrai grandes personalidades. Certa vez, vendo no pianista austríaco, Henri Herz, uma possibilidade de sucesso, e tendo assistido inúmeras vezes a seus concertos, (é verdade que amava a música), a cortesã simula um desmaio. É acudida por muitos , inclusive  pelo virtuose,  que se encanta  com aquela desconhecida. Mas, afinal, quem será ela? De onde vem? Qual seu passado? Sem se importar, leva-a para morar com ele. Tudo "comme il faut"! Agora são Monsieur e Madame Herz e têm uma filhinha. O músico é rico, e possui uma manufatura de pianos. Nada está mais na moda do que ter um piano Herz. Mas esta devoradora  de dinheiro leva-o à ruína. E ele é  obrigado a partir para a América. Sem haver se casado, a família do músico,  revoltada, expulsa-a do apartamento. Por essa época,  ocorre a Revolução de 1848, que, como todas as Revoluções, não é conveniente ao comércio da galanteria.  

Mas, logo surge uma barão português, imensamente rico em terras e em dívidas, o quê Thérèse não sabe. Ele é atraente e lhe traz um título de nobreza. Casam-se , já que o casamento com o pianista  não fora efetivado. Casamento na Igreja Católica e também no civil. Seu primeiro marido Villoing  , o alfaiate, havia retornado à França com o filho e "...e tem a feliz idéia de morrer em 1849!"  Logo, Thérèse está livre ! Mas se o título lhe trouxe a nobreza, o marido lhe trouxe problemas. Beberrão, mulherengo, a endivida! Logo ela! E um belo dia, ela se cansa. Coloca-o fora de casa, e manda-o para um hotel. Quer recomeçar sua vida. O ano é 1853.  Pleno Segundo Império. 

Mas , afinal, o título e o nome lhe trazem sorte. Durante anos, La Paiva , como é conhecida, é mal vista, sussurra-se sobre seu passado, mas ela continua a frequentar os lugares de elite. Até o surgimento de um certo rapaz vindo de  uma região chamada Silésia entre Polônia e Alemanha. Riquíssimo, queria gozar a vida, e logo que conhece Thérèse se apaixona , apesar de ser onze anos mais jovem do que ela. Agora, chegou a hora da revanche sobre  todos aqueles que a desprezaram.  Vive no luxo, e comenta Napoleão III, que seu camarote tem mais conforto do que o da Imperatriz Amélia.  

No seu palacete, o leito proposto pelo arquiteto, extremamente caro, é recusado por ela, que achava que poderia valer o dobro. Tudo sob o olhar complacente do amante. Conta-se que num baile da pequena burguesia, tão comum naquele tempo, duas garotas pobres espiam o palacete e uma diz à outra: "Um palacete como este!!! Ao que a outra retruca: "Fácil, basta tirar a calcinha!!"  Mas em julho de 1870, a partir de uma tramoia de Bismark, o Chanceler prussiano, Napoleão III dá um passo em falso e declara guerra. Objetivo de Bismarck , reunir os diferentes reinos e ducados e formar o Estado Alemão. A França é vencida e Napoleão III tem que abdicar.

Por sorte sua, Paiva havia se suicidado, o quê ela comemora. Agora, totalmente livre e pode casar-se com seu amante. Nesta época, a cortesã já era, para os padrões da época, uma mulher madura. Havia engordado, seus traços semíticos tornaram-se mais pesados. Olhando para a imagem da noite e do dia, pintadas no teto de seu palácio,  aquela não parecia, a mesma mulher. Mas seu amante continuava apaixonado! Qual seria seu sortilégio sexual?

Mas era preciso tomar uma atitude. Prudência exigia deixar a França. A cortesã , obesa , e ainda coberta de diamantes,  lança um último olhar a seu palácio. Alguns anos depois,  morre, na agora Alemanha, num estranho castelo que tenta imitar aquele de Paris.  O motivo  de sua morte? Uma hipertrofia do coração! Justo ela, que jamais tivera um!

Proximamente, postarei a história de outras cortesãs que deixaram seus nomes na história da galanteria .




















XIX

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