Cortesã , princesa e santa.
Ela nasceu Anne-Marie Chassaigne, no dia 2 de julho de 1869, bem no interior da França. Vinha de uma família de militares, extremamente conservadora, e foi a última filha e a única mulher, o quê não significa que tenha sido mimada. Sua família era pobre e viviam em extrema dificuldade. Aos nove anos, entra para o convento de Sainte-Anne-d'Auvray , dirigido pelas Fidèles Compagnes de Jésus. Tinha "unhas pretas e piolhos na cabeça" Mas, ao cabo de três dias, tudo isto desaparece, e ela reaparece completamente mudada. Ainda que fosse motivo de galhofa, segundo seu próprio relato.
Agora, já na adolescência Anne-Marie começa um rápido desabrochar. É junto às freiras que ela se transforma em beleza e cultura. Obtendo aquilo que não foi concedido à sua rival , Carolina Otero. E será sempre grata àquelas que a transformaram. Fundada sob a Restauração, que tem fim em 1830, esta Ordem tem a missão de educar jovens pobres. O sucesso é tal que muitas jovens abastadas passam a frequentar o convento. Anne-Marie aproveitará muito bem esta oportunidade. Ela cresce em beleza e cultura. Entra em contato com os clássicos, o que lhe permitirá, mais tarde, escrever seu próprio diário. Poderá ser admirada por poetas como Jean Cocteau, os irmãos Goncourt, escritores , além de outros intelectuais que se tornaram seus amigos ou amantes.
Filha e irmã de militares , em 1886, aos 17 anos , Anne-Marie casa-se com Armand Pourpe, oficial da marinha . Breve lua de mel em Paris, onde encontra um mundo desconhecido, que a encanta. E ainda constata que, na capital, sua beleza e elegância atrai olhares. Armand é brutal no seu ciúme. Ela contesta. Adora sua silhueta esbelta. Mas um dia, poucos meses após o casamento, ela descobre , com imenso pesar que "a esbeltez de sua silhueta não mais será do que uma lembrança." Gravidez dolorosa , parto doloroso. É assim que ela imagina sua nova situação. Considera que depois da violência do "estupro" (?) sucederia a violência do parto. E após o nascimento do filho, Marc, ela constata que não tem vocação para a maternidade.
Após uma mudança para Toulon, cidade bem mais interessante do que a provinciana Lorient, Anne-Marie, deixando de lado a honra conjugal, descobre o prazer de ter um amante. Ao descobrir o adultério, tendo flagrado os dois na cama, o marido furioso desfere um tiro que a atinge nas costas, sem grandes consequências. A partir daí, ela tem uma boa razão para pedir o divórcio. Seu filho fica aos cuidados dos avós paternos e ela pode partir livre para recomeçar sua vida em Paris.
"Amour du luxe , l'amour de la liberté , et aussi , comme aurait dit Saint Augustin "l'amour de l' amour"..." Ela se transforma em Liane de Pougy, e descobre que não pode se limitar a um só homem ou a uma só mulher. Sim, porque ela ama e é amada por homens e mulheres. Várias hipóteses existem para a escolha de seu novo nome. O quê se sabe é que, chegando em Paris, foi morar com alguma amiga que já vivia de suas graças. Sabe-se que começou de baixo, nas chamadas "maisons closes" onde devia se sujeitar a qualquer exigência, mas, pouco a pouco, foi subindo na escala das profissionais. Tendo superado sua mestra, a célebre Valtesse de la Bigne, cortesã e última amante de Louis Napoleão Bonaparte. Conta, com orgulho que o Embaixador da Grécia a reteve por mais de uma hora e a pagou com verdadeiras pérolas
Para estas cortesãs, e são muitas, há todo um ritual que devem cumprir cada dia. Mostrar-se no Bois de Boulogne, almoçar no restaurante Weber, jantar no Paillard, apresentar-se em um camarote de um teatro famoso, cear no Larue. Se Valtesse se especializara em artistas, como o músico Jacques Offenbach , Liane se especializaria em reis, políticos, e jornalistas, que faziam publicidade de seu ofício. Finalmente, ela entra no "gratin de la galanterie." Segura de si mesma , ela não esconde sua bissexualidade, e munida de bastante cultura escreve "Idylle saphique" inspirado em sua ligação com Nathalie Clifford Barney, milionária americana, também escritora. Ela se apresenta como atriz , seja em Paris ou Londres. Seu sucesso é inegável. Entre seus amantes constam o Marquês de Mac Mahon, Henri Meilhac, libretista de Offenbach , o banqueiro Maurice de Rothschild. Mas ela também tem rivais, muitas, como Colette, misto de cortesã e escritora, e a requisitada Emilienne d'Alençon, outra cortesã famosa. Escritores como Max Jacob a iniciam à leitura dos clássicos.
Já madura , casa-se com um rapaz dez anos mais jovem, mas o casamento dura pouco. Finalmente , em 1908 , encontra o príncipe romeno Georges Ghika, com quem se casa em 1910. Este casamento escandaliza toda a sociedade, desde as mondaines até a dita sociedade bem constituída. Afastam-se de todos e passam seus dias seja em Roscoff , na Bretanha ou nos arredores de Argel.
Finalmente , como diz seu biografo Jean Chalon, "Mort d' un fils, et naissance d'une mère" É verdade que, durante muito tempo, Liane havia se esquecido da existênica de seu filho, Marc. Depois de muito tempo, seus contatos eram esporádicos. Mas o definitivo acontece durante a Primeira Guerra, quando Marc, aviador, morre. Liane sente uma profunda dor, e grande remorso por aquele total abandono. É neste momento que ela se aproxima de Deus, que também havia esquecido. Procura consolo na religião. Mas ainda está com o príncipe. Tentam recomeçar, mas ele a trai, está gravemente doente e, além do mais, tornou-se alcoólatra. Morre em 1945.
Espiritualmente acompanhada por Mère Marie-Xavier, durante trinta e dois anos, reabilita-se tratando de doentes mentais no asilo Sainte Agnès. Em 1939, pede ao Père Alex Ceslas Rzewuski, seu confessor e depositário de seus Cahiers Bleus,, que os publique, o que ele fará somente em 1977. Em 1943, ele admite sua penitente "digna de ser recebida sob o nome de Soeur Anne-Marie de la Pénitence no "Thiers Ordre de Saint Dominique" .
Soeur Anne-Marie de la Pénitence morreu no dia 25 de dezembro de 1950.
Resquiescat in Pace
"Liane, ah! ma Liane, c' est mon souvenir le plus voluptueux. Et dire que, à la fin de sa vie, elle prédendait que j' avais été son plus grand péchê .
"Liane, ah! minha Liane, é minha mais voluptuosa lembrança. E pensar que, no fim de sua vida, ela pensava que eu havia sido seu maior pecado"
Natalie Barney a Jean Chalon um dos biógrafos da cortesã. No outono de 1963.
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